A Beleza Artificial e Suas Consequências. O Mito da Mulher Jovem e Magra.
Sensopercepção é a leitura pelos nossos sentidos da realidade
que nos cerca. O nosso cérebro busca interpretar os estímulos
recebidos e torná-los compreensíveis à nossa inteligência.
Porém, a sensação que os nossos sentidos podem obter a partir de
estímulos visuais, auditivos ou olfatórios pode ser influenciada
por múltiplos fatores, tais como: a experiência pessoal de cada
um, os aspectos culturais da sociedade onde se vive, ou onde se
foi criado e educado, referenciais de beleza que a pessoa
utiliza em sua mente como uma espécie de “modelo mental" de
referência de beleza, etc.
Sabemos ainda, que todas essas variáveis estão sujeitas a
mudanças e até a condicionamentos, e é este o objetivo deste
artigo, falar sobre o Condicionamento Mental atual imposto pela
mídia no que diz respeito a referenciais de beleza
artificialmente produzidos.
Além dos já bem conhecidos recursos do photoshop, algumas das
“técnicas” utilizadas pela indústria da beleza não passam de
meros truques psicológicos que têm por finalidade “fazer a
cabeça” dos consumidores. São muito comuns em propagandas
veiculadas através da mídia (televisão, jornais, revistas,
periódicos, filmes, etc.). Alguns profissionais de propaganda
aprendem a manejar a chamada Psicologia do Consumidor.
Parte destes truques é bombardear a mente das pessoas com
estímulos visuais e auditivos, estrategicamente dispostos, e
repetitivamente apresentados aos consumidores com insinuações,
pouco perceptíveis pela maioria, de que aquilo é que é realmente
belo ou realmente bom, portanto compre !
Vejamos um exemplo interessante: Um pesquisador russo chamado
Ivan Pavlov (1849-1936), em uma famosa experiência de
condicionamento do comportamento, descobriu que cães que eram
alimentados com rações de carne em pó salivavam além do normal.
Pavlov, então, passou a tocar um sino todas as vezes que os cães
iam se alimentar. Posteriormente, ao ouvirem o sino, os cães já
começavam a salivar antes mesmo de serem alimentados. E pouco
tempo depois, mesmo que não fossem alimentados, mas tocando-se o
sino, os cães salivavam do mesmo jeito.
Entendendo a Experiência de Pavlov
Na experiência de Pavlov, a ração de carne funcionava como o
estímulo não condicionado, ou seja, um estímulo normal. E a
salivação era a resposta fisiológica ao estímulo.
Após a repetitiva exposição dos cães à associação sino-ração de
carne, o som do sino tocando passou a ser um estímulo
condicionado e a salivação uma resposta automática e
condicionada ao som do sino.
O Truque do Condicionamento Mental na Prática da Propaganda
1- Uma mulher atraente é mostrada e causa resposta emocional nos
homens (resposta não condicionada).
2- Uma mulher atraente + um belo carro são mostrados repetidas
vezes e causam estímulos (estímulos não condicionados).
3- Um belo carro é mostrado e causa um estímulo condicionado.
Os
Resultados Disto
Para os interessados em que você consuma é uma estratégia
eficaz, pois conseguem condicionar a mente de muitas pessoas a
achar estimulante aquilo o que eles desejam vender. E isto têm
levado muita gente a sofrer até mesmo de angústias e ansiedades
porque não conseguem atingir, ou se parecer, com os “modelos de
referência” dos truques psicológicos das propagandas.
A situação seria muito diferente se aquilo o que querem vender
fosse simplesmente apresentado ao público sem truque psicológico
algum. A mente, então, estaria livre para poder realizar a sua
opção de um modo bem mais autêntico. Mas não é isto o que
acontece no dia a dia, infelizmente.
Truques Persistentes com as Mulheres
Certa vez estive observando fotos de capas de revistas femininas
de moda com mulheres muito bonitas e bem vestidas. Todavia, algo
me chamou a atenção: todas pareciam excessivamente maquiadas e
parecia haver algo de desproporcional naquelas fotos, algo que
não percebi logo de imediato. Posteriormente, pesquisei e me
tornei ciente de que algumas daquelas moças eram ainda
adolescentes ou adultas jovens (menos do que 24 anos de idade),
o que explica a beleza jovial. Mas então, por que e para que
aquele excesso de maquiagem? Era para que parecessem mais
velhas, ou seja, eram revistas lidas por mulheres, em sua
maioria adultas e de meia idade, e aquelas moças estavam
vestidas e maquiadas como se pertencessem à idade das leitoras
mais velhas. O propósito disto era criar na mente das leitoras a
falsa idéia de que poderiam, aos 35 ou aos 40 anos, ter uma
aparência igual ou semelhante à daqueles modelos ainda muito
jovens. Isto é um truque bastante sutil de condicionamento
mental.
Trata-se de um truque psicológico, pois ninguém que tenha 35 ou
40 anos jamais poderá ter uma aparência de quem tem 18 anos. Um
estudo em Geriatria (a especialidade médica que trata do
envelhecimento) mostrou que os traços de envelhecimento já
começam a aparecer por volta dos 25 anos de idade. Neste estudo,
foram selecionadas moças com as idades entre 18 e 21 anos, e
foram selecionadas também moças com as idades entre 22 e 25
anos. Todas as moças foram postas, juntas, diante de algumas
pessoas que não sabiam a idade de nenhuma delas. Foi pedido ao
grupo que apontasse as 10 moças que pareciam ser mais novas.
Todos no grupo apontaram para as que tinham as idades entre 18 e
21 anos. E o que este estudo demonstra? Demonstra algo que
muitos não gostam de ouvir, mas a verdade é que todos
envelhecemos, e os sinais do envelhecimento podem ser visíveis
bem cedo em diversas pessoas.
O
Mito da Mulher Jovem e Magra
O mito artificialmente criado da imagem de beleza associada à
uma mulher jovem e magra apresentado pela mídia tem origem nos
primórdios dos desfiles de moda na França, lá pelo início do
século XX. Após perceberem que o caimento das roupas
confeccionadas a partir de desenhos feitos em modelos (bonecos)
de arame, não se adequava a diversos biotipos, os estilistas
passaram a dar preferência às mulheres magras (cuja silhueta
mais se assemelhasse aos manequins de arame onde costuravam suas
roupas). E isto acontece até hoje.
O
“modelo ideal” da costura parisiense difundiu-se pelo mundo
todo, causado efeitos por vezes bastante inadequados no modo de
aceitação do próprio corpo, principalmente entre as adolescentes
e entre as mulheres mais jovens (o que em si já é um dado
curioso, pois isto não deveria ocorrer com as mulheres mais
velhas?). Mas isto está acontecendo porque cada vez mais os
especialistas em propaganda e as indústrias envolvidas com a
moda têm conseguido suscitar em muitas mulheres a busca por
modelos de beleza inatingíveis para a grande maioria das
mulheres.
Esta insatisfação com o próprio corpo e aparência costuma, além
do potencial de comprometer negativamente a auto-estima, levar
muitas mulheres a gastar cada vez mais dinheiro com cosméticos,
com tratamentos para emagrecer, com cirurgias estéticas, roupas
sempre sendo abandonadas e trocadas por roupas novas, enfim,
tudo isto acontecendo devido à pressão psicológica exercida nas
mulheres de hoje. Em diversos casos, estas mulheres são
influenciadas pela mídia para atingir algo que só existe na
mente, ou seja, uma imagem artificial de beleza nas quais buscam
se projetar.
Algumas Estatísticas
Uma pesquisa promovida por uma revista inglesa verificou o
seguinte:
- 79% de 2000 mulheres entrevistadas acreditavam que sua vida
social melhoraria se elas fossem mais magras.
- 83% pensavam que as celebridades que estivessem acima do peso
viviam vidas infelizes.
- 70% acreditavam que pessoas acima do peso eram geralmente
vistas como sendo pessoas menos inteligentes e menos atraentes.
- 88% das meninas sentiam a necessidade de parecer "perfeitas".
- 60% disseram que a sua aparência era a sua maior preocupação
na vida.
Estatísticas também fornecidas pela revista Natural Health
(Saúde Natural) constataram o seguinte:
- 44% das mulheres que estavam com o peso normal ou que estavam
abaixo do peso pensavam que estavam com excesso de peso.
Ainda outra pesquisa, conduzida pelo canal Better Health Channel
(Canal Saúde Melhor), constatou o seguinte:
- Homens e mulheres com o peso normal- 45% para as mulheres e
23% para os homens- achavam que estavam com excesso de peso.
- Mulheres abaixo do peso- pelo menos 20% das mulheres que estão
abaixo do peso pensavam que estão com excesso de peso e estavam
fazendo dieta para perder peso.
Também segundo uma pesquisa feita pela rede de televisão
norte-americana NBC:
- 60% das mulheres já fizeram dieta ou estavam em dieta.
- 44% das mulheres se recusariam a se deixar fotografar em
roupas de banho.
- 37% das mulheres não jogam os jogos de praia se estiverem
usando roupas de banho.
- Somente na Inglaterra há mais de um milhão de mulheres
sofrendo de Anorexia.
Um Cinto que só existia na
Mente
Certa vez um conhecido meu saiu a fim de comprar um cinto. Andou
pela cidade toda, visitou várias lojas, experimentou vários
cintos, mas por fim, nenhum dos cintos lhe serviu. Acabou não
comprando cinto nenhum. Alguns dias depois, meditando no que
havia acontecido, ele me disse que não havia encontrado o cinto
que queria pois aquele cinto só existia em um único lugar, na
imaginação dele. E é este o efeito deletério que a moldagem
artificial da beleza tem causado em tantas pessoas. Tristemente.
Em suma, esses enormes lucros que obtêm a indústria da moda são
obtidos em parte pela criação de um profundo senso de
insatisfação entre milhões de mulheres com os seus próprios
corpos, e estes lucros aumentam mais na medida em que também
aumenta a distância entre o “corpo ideal” e a realidade.
Referências:
- Allie Kovar, Effects of the Media on Body Image. Vanderbilt
University.
- Cusumano, Dale, and J. Kevin Thompson. "Body Image and Body
Ideals in Magazines: Exposure, Awareness, and Internalization".
- Grabe, Shelly, Janet Hyde, and L. Monique Ward. "The Role of
the Media in Body Image Concerns Among Women: A Meta-Analysis of
Experimental and Correlational Studies".
- Justin Fenner. "Should The Use Of Skinny Models Be Illegal?".
Styleite.
- Nutrition & Eating Concerns, Body Image. Brown University.
Dr
Eduardo Adnet
Médico Psiquiatra e Nutrólogo
Especialista Titulado AMB/ABP/ABRAN